O Painel Temático “Mulheres Sem Fronteiras: Liderando a Inovação Colaborativa para um Mundo Mais Conectado”, realizado na tarde desta segunda-feira (13), reuniu vozes inspiradoras do ecossistema de inovação para debater desafios, trajetórias e estratégias de colaboração. Moderado por Alessandra Ruchet, analista de Empreendedorismo e Inovação do Sebrae, o painel contou com Rosilda Prates, presidente da P&D Brasil; Lilian Natalie Barreiros Natal, diretora de Marketing, Negócios e Eventos da Rede Mulher Empreendedora; Melina Sara de Castro Borges, consultora em Projetos de Inovação e Comunidade da Biominas Brasil; e Maria de Fátima, gestora do projeto Empreendedoras Tech no Sebrae Nacional.
O debate revelou dados alarmantes sobre sub-representação feminina em ciência, tecnologia e investimentos, mas também apresentou caminhos concretos de transformação. As painelistas compartilharam experiências pessoais que expõem barreiras estruturais desde a infância até os conselhos de administração, propondo ações que vão do estímulo educacional à ocupação de espaços de decisão.
Trajetórias que revelam barreiras estruturais
Maria de Fátima abriu as apresentações com relato marcante. Sua primeira reunião na unidade de inovação do Sebrae, em 2021, reuniu 30 pessoas. Ela era a única mulher e a única pessoa negra. A gestora percebeu imediatamente o desafio pela frente e tomou como causa trazer mais diversidade para o ambiente de inovação, onde mulheres e pessoas negras preparadas enfrentam falta de acesso a programas institucionais. “O que acontece muitas vezes é que a gente tem mulheres e pessoas negras totalmente preparadas, já atuando com inovação; às vezes faltava acesso”, explicou Maria de Fátima, que atua há mais de sete anos na pauta do empreendedorismo feminino no Sebrae Nacional.
Sua fala apontou a raiz do problema, que começa nos estímulos diferenciados desde a infância. Meninas ganham casinhas e bonecas; meninos, blocos de construção. Essa divisão reproduz-se nas faculdades de engenharia e consolida-se nos escritórios de inovação. Maria de Fátima defendeu três pontos estruturantes para reverter esse cenário. Primeiro, colocar mulheres em posições de tomada de decisão. Segundo, incentivar financeiramente os negócios liderados por mulheres. Terceiro, estimular meninas desde cedo para áreas de ciência e tecnologia.
Rosilda Prates compartilhou observação sobre comportamentos em reuniões. Ela destacou que homens tendem a falar com segurança sobre aquilo que têm dúvida, enquanto mulheres falam com dúvida sobre aquilo que dominam. “Esse divisor de águas é muito importante para as mulheres, que por vezes têm o seu espaço delimitado”, afirmou Rosilda Prates, presidente da P&D Brasil e conselheira em diversos órgãos como o Conselho Nacional de Desenvolvimento da Indústria e a FINEP.
A presidente da P&D Brasil defendeu a indústria nacional com dados concretos. No ano passado, as empresas associadas investiram mais de 2 bilhões de reais em pesquisa e desenvolvimento. Ela citou o artigo 219 da Constituição Federal, que define o mercado interno como patrimônio nacional, para fundamentar sua defesa da inovação desenvolvida no Brasil. Segundo Rosilda, quando a tecnologia é desenvolvida no país, 85% da riqueza fica retida nacionalmente, contra apenas 25% a 30% quando é apenas importada.
Vieses em investimento e a necessidade de times mistos
Lilian Natalie Barreiros Natal compartilhou experiências de 10 anos no ecossistema, desde sua startup até papéis em venture capital. Ela relatou que, ao buscar investimentos para sua startup, recebeu perguntas invasivas sobre estado civil, filhos e planos de maternidade, enquanto seu sócio homem era questionado sobre competências técnicas e plano de negócios. A diretora fazia apresentações em salas repletas de investidores homens, sem nenhuma mulher presente, e observava que os investidores direcionavam perguntas ao sócio mesmo quando ela as formulava.
A diretora da Rede Mulher Empreendedora destacou que apenas 3% dos investimentos em startups no Brasil são feitos por mulheres. Lilian defendeu times mistos com dados concretos: empresas com mulheres na liderança têm 35% mais inovação e 25% mais resultados financeiros. Ela alertou para a sub-representação em inteligência artificial, onde apenas 12% dos profissionais são mulheres. Segundo a executiva, algoritmos não são neutros e refletem os vieses de quem os constrói, criando um futuro potencialmente excludente.
Ciência aplicada e a criação de ambientes seguros
Melina Sara de Castro Borges, com nove anos de atuação em biotecnologia e inovação, conectou sua trajetória à ciência aplicada, área tradicionalmente masculina onde cerca de 30% dos cientistas são mulheres. A consultora destacou que nos últimos anos quase 50% dos artigos publicados contam com participação feminina, evidenciando protagonismo crescente apesar do ambiente hostil.
Melina enfatizou a criação de pontes e ambientes seguros para conexões. Ela compartilhou experiência recente ao participar de evento sobre empreendedorismo feminino em Belo Horizonte, onde conheceu empreendedora da área de dermocosméticos para peles sensíveis. Hoje são sócias, desenvolvendo ativos biotecnológicos para cosméticos e saúde baseados na biodiversidade brasileira. Apenas este ano, captaram cerca de 90 mil reais em três editais de subvenção para pesquisa e desenvolvimento.
A consultora alertou para o acúmulo de funções das mulheres, que dedicam 17% a menos tempo ao empreendedorismo devido a atividades de cuidado. Ela questionou como criar ambientes que possam aliviar essa sobrecarga, permitindo que mulheres alcancem seu potencial pleno sem precisar escolher entre maternidade e carreira. A maior parte das mulheres à frente de negócios hoje empreende por necessidade após demissões pós-licença-maternidade ou impossibilidade de conciliar carreira corporativa com maternidade.
Divisão de trabalho doméstico e educação contínua
O diálogo evoluiu para estratégias concretas de apoio. Rosilda Prates defendeu a divisão igualitária de tarefas domésticas e o racionalizar sobre a casa como responsabilidade compartilhada. Ela compartilhou iniciativa própria em Brasília: as “salas de conteúdo”, ambientes seguros onde mulheres discutem política, tecnologia, arte e cinema. No ano passado, 220 mulheres participaram. A presidente da P&D Brasil explicou que o formato permite discussões francas em ambiente de confiança, onde mulheres podem expressar opiniões sem receio de julgamento.
A presidente da P&D Brasil defendeu educação contínua como base para ocupação de espaços de poder. Rosilda enfatizou a necessidade de senso crítico e capacidade de argumentação, construídos por meio do conhecimento acumulado. Segundo ela, ter conteúdo sólido é condição fundamental para que mulheres sejam respeitadas em ambientes dominados por homens.
As painelistas concordaram que, embora o foco ainda seja necessário na equidade de gênero, o ideal é um futuro onde esses debates sejam obsoletos. Rosilda concluiu esperando que em 2050 não seja mais necessário debater o espaço legítimo da mulher, mas sim discutir a agregação de valor, produtos lançados no mercado, propriedade intelectual e inserção na cadeia global de valor, independente de gênero.
Contribuições do público enriqueceram a conversa. Amanda Schutzenberger, professora da Universidade Federal do Paraná, citou a Lei 14.667, sobre a Semana do Empreendedorismo Feminino, indagando como incentivar jovens mulheres inseguras. Maria de Fátima respondeu com provocação, questionando o que será dito aos homens sobre como se colocar como aliados nessa transformação, pois a colaboração de todos é necessária.
O painel reforçou os eixos de conectividade global e ecossistemas colaborativos da conferência, mostrando como a liderança feminina transforma desafios em oportunidades sustentáveis e com impacto regional e global. Entre as recomendações concretas estão criar redes seguras de apoio, incentivar investimentos em negócios liderados por mulheres, promover empatia e inteligência social nas inovações digitais, e construir ambientes institucionais capazes de aliviar o acúmulo de funções femininas, permitindo maior dedicação ao empreendedorismo inovador.
Sobre a 35ª Conferência Anprotec
A 35ª Conferência Anprotec acontece de 13 a 16 de outubro de 2025, em Foz do Iguaçu (PR), com o tema “Ecossistemas colaborativos e integrados à inovação global”. O evento é promovido pela Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). A realização local é do Sistema Estadual de Ambientes Promotores de Inovação do Paraná (Separtec), da Fundação Araucária, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) e do Governo do Estado do Paraná.