Entre a promessa de propósito e a necessidade de proteção, empresas e trabalhadores enfrentam o desafio de transformar o ESG em prática concreta sem renunciar a direitos ou da competitividade.
O ESG virou mantra corporativo, mas sua aplicação no ambiente de trabalho ainda é um campo minado. Enquanto empresas tentam engajar funcionários em práticas sustentáveis, enfrentam dilemas que vão muito além da comunicação interna. A questão é… Como equilibrar propósito com produtividade, direitos trabalhistas com proteção empresarial, e engajamento genuíno com metas de desempenho? Nem Freud entraria nessa arapuca!
Essa difícil equação (quase ‘quântica’) entre valores e interesses prova que o ESG, quando levado a sério, exige mais do que boas intenções. A prática REAL, demanda estruturas sólidas, liderança exemplar e disposição para enfrentar tensões históricas entre capital e trabalho. E nesse embate, não há lado inocente e nem mártires: há responsabilidades compartilhadas e riscos que precisam ser reconhecidos por todos. Acredito que há tempos, um dos grandes problemas – também – nesta equação, são narrativas políticas que – ao invés de proporem soluções, apenas criticam ou acusam… (este será tema para um artigo inteiro…Prometo fazê-lo)
Propósito compartilhado ou discurso de fachada?
Esta é uma pergunta recorrente que assombra gestores e o board de muitas empresas. Fato é que… transformar o ESG em identidade organizacional exige mais do que slogans e campanhas de publicidade. (aliás, só isso pode levar a empresa a cair ladeira abaixo…).
Entenda! É preciso que a liderança articule um propósito claro, que conecte o negócio à sociedade. Empresas como Natura, Gerdau ou Braskem são reconhecidas globalmente por sua governança socioambiental, mostram que quando o propósito é vivido — e não apenas comunicado — o engajamento floresce e dá frutos. Mas cuidado!! A postura Ética do propósito e da ação SEMPRE precisam ser revisadas e oxigenadas… Algumas dessas empresas que citei já tiveram tropeços na caminhada…
Fique atento, pois, a criação de uma visão compartilhada, com metas que dialogam com o cotidiano dos colaboradores, gera senso de pertencimento e reduz o cinismo organizacional.
Mas há um risco: quando o discurso ESG é usado como verniz reputacional, sem coerência interna, ele se torna combustível para desconfiança. Funcionários percebem a dissonância entre o que se prega e o que se pratica — e isso mina qualquer tentativa de engajamento. E, em casos mais graves, tem sido – também – motivo de muitos processos trabalhistas… (este será um assunto -também – para um artigo inteiro).
Educação como base, não como evento… Observe essa afirmação como um mantra!
Treinamentos pontuais não bastam. A formação em ESG precisa ser contínua, transversal, conectada as pessoas e inserida no DNA da empresa e a realidade do negócio. Empresas como o Grupo Boticário, Sicoob e a MRV Engenharia, têm feito investimentos em plataformas de e-learning, visitas técnicas, viagens para troca técnica e cultural, e programas de capacitação que vão além do básico. A ideia é transformar conceitos como diversidade, compliance, impacto ambiental em decisões cotidianas sem complicação, de fácil entendimento e aplicabilidade.
Entretanto, o processo de educação também precisa ser crítico. Não basta ensinar o “como fazer” — é preciso discutir os “por quês de fazer” e o “para quem fazer”. Sem isso, o ESG corre o risco de virar um checklist técnico, esvaziado de sentido, ou perdido dentro de ‘Relatórios de Sustentabilidade’… que ninguém lê… só servindo como itens de decoração.
Participação real ou teatro de escuta? Pergunta (reflexiva) que deve virar rotina…
Criar comitês ESG, abrir canais de sugestão, promover hackathons, formações personalizadas e inovadoras são práticas que funcionam — desde que não sejam simbólicas. A cocriação precisa vir acompanhada de poder real de decisão. Um exemplo são as formações reflexivas, com olhar na Inovação e com muita gamificação desenvolvido pelo On Life Institute, criação do Doutor em Design Estratégico, Flávio Nerva. Outro exemplo é a Ambev, que estruturou grupos de diversidade com orçamento próprio e metas vinculadas à estratégia da empresa. Isso muda o jogo: funcionários deixam de ser plateia e passam a ser protagonistas…inclusive de novas visões de futuro!
Mas há um limite delicado: a participação não pode ser usada como escudo para decisões já tomadas. Quando a escuta é encenada, ela gera frustração e desmobiliza. O engajamento só é legítimo quando há espaço para influência real. E esse é o significado real de ENGAJAMENTO.
Outro ponto de análise, em toda essa ‘equação’, são os benefícios oferecidos…
Reconhecimento: incentivo ou manipulação? Premiações, selos internos e bonificações por metas ESG são estratégias eficazes — se bem calibradas. O Magazine Luiza, por exemplo, criou programas de reconhecimento para equipes que se destacam em inclusão e impacto social. Isso reforça comportamentos desejados e valoriza o esforço coletivo.
No entanto, há um risco de captura quando os incentivos são mal desenhados, eles estimulam o jogo de aparências. Funcionários podem simular engajamento para ganhar pontos, sem internalizar os valores. O desafio é criar sistemas de reconhecimento que premiem a consistência, e não apenas a performance visível. Há empresas que estão hoje com um grande problema interno por conta do ‘Frankenstein’ de premiações e benefícios… E como parar e reestruturar?
Metas claras, mas não cegas!! Indicadores são essenciais. Sem metas mensuráveis, o ESG vira retórica. Empresas como a Vivo e o Santander Brasil, publicam dashboards mensais com KPIs ambientais, sociais e de governança, acessíveis a todos os colaboradores. Isso gera transparência e senso de progresso.
Mas, metas também podem cegar. Quando os indicadores são tratados como fim — e não como meio — eles distorcem comportamentos. A obsessão por números pode levar à superficialidade ou ao greenwashing interno. O equilíbrio está em combinar métricas com narrativas, dados com contexto.
Feedback contínuo: escuta ativa ou vigilância? Canais de escuta — como enquetes, rodas de conversa e plataformas de sugestões — são fundamentais para ajustar rotas e prevenir crises. Um exemplo é a Votorantim Cimentos, que criou fóruns internos para discutir dilemas éticos e ambientais com participação da alta liderança.
Mas é preciso cuidado: o monitoramento excessivo pode ser percebido como vigilância. A cultura do feedback só funciona quando há confiança e quando os canais são usados para construir, não para punir. Caso contrário, o ESG vira instrumento de controle, e não de transformação.
É um pouco assustador tantos pontos que parecem contraditórios um com o outro. Eu sei! Mas a vida não é linear… A gente aprende com mais consistência pelo exemplo!
Liderança como espelho. Nada engaja mais do que o exemplo. CEOs que participam de ações de voluntariado, diretores que lideram comitês de diversidade, gerentes que assumem metas ESG em suas avaliações — tudo isso comunica mais do que qualquer campanha. A Unilever, por exemplo, atrela parte do bônus executivo ao desempenho em sustentabilidade.
Mas o exemplo precisa ser autêntico. Quando a liderança terceiriza o ESG para áreas específicas, ela sinaliza que o tema é periférico. E se a alta gestão não se compromete, o resto da organização não segue. Simples assim…
A tensão legal: proteção ou precarização? Partindo da observância que a legislação trabalhista brasileira evoluiu para proteger o trabalhador – da CLT de 1943 à Constituição de 1988 -, passando pela reforma de 2017. Esses marcos garantem direitos fundamentais, mas também impõem rigidez em um mercado que exige agilidade. Empresas e startups enfrentam o desafio de se proteger de condutas antiéticas, fraudes internas e baixa performance, sem violar garantias legais.
Entenda que a tensão é real: como demitir um funcionário que sabota iniciativas ESG sem cair em armadilhas jurídicas? Como monitorar condutas sem invadir a privacidade? Como tornar público a identidade de funcionários que usam informações estratégicas para seu benefício pessoal? As respostas estão na proporcionalidade: políticas claras, processos justos e canais de denúncia com salvaguardas. Isso, para começar.
Entenda: Nem tudo é má-fé — mas nem todo colaborador é agente de transformação.
Pesquisadores como Ricardo Abramovay e Ladislau Dowbor, defendem que o ESG só será efetivo se redistribuir poder dentro das organizações. Eles acreditam que não basta incluir o trabalhador na execução — é preciso incluí-lo na decisão. Já estudiosos, como Eduardo Giannetti e Hélio Zylberstajn, alertam para os riscos de sobrecarga regulatória e perda de competitividade se o ESG for tratado como imposição moral, e não como estratégia de valor e de inovação.
Essas visões revelam o dilema central. O ESG pode ser ponte ou muro. Pode unir interesses ou aprofundar desconfianças. Tudo depende de como ele é implementado — e de quem tem voz no processo. Engajar funcionários em ESG é mais do que uma boa prática — é um teste de coerência institucional. Exige que empresas revejam seus sistemas de poder, que trabalhadores assumam responsabilidades e que ambos aceitem conviver com a tensão entre ideal e realidade.
Não há fórmula mágica. Há, sim, uma equação difícil — e inescapável — que só se resolve com diálogo, transparência e coragem para enfrentar as contradições morais que o ESG escancara.
Tudo pode ser repensado e redesenhado. Mas a ÉTICA, deve ser inegociável!
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KÁTYA DESESSARDS | Conselheira e Mentora em ESG e Comunicação Estratégica. Integrante do Institute On Life – Co-Autora no livro: Gestão! Como Evoluir em uma Nova Realidade?.
Experiência de 27 anos em diversos setores do mercado. | Quer Saber Mais? CLICK AQUI 