Após um crescimento acelerado entre 2020 e 2022, os investimentos em ciência e inovação a nível global sofreram uma queda significativa, com indícios de recuperação apenas em 2024, marcando uma reversão notável em relação aos anos anteriores, principalmente em regiões emergentes, como aponta o Índice Global de Inovação (IGI) de 2025. No cenário regional, o Chile e o Brasil se destacam, respectivamente, como líderes neste quesito na América Latina e Caribe. Entretanto, essa desaceleração recente trouxe à tona desafios estruturais que ameaçam a maturidade dos ecossistemas de inovação e a competitividade das empresas.
Este contexto reforça a necessidade de políticas públicas eficazes, em especial os incentivos fiscais direcionados à Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I), como a Lei do Bem no Brasil, para a manutenção da conjuntura socioeconômica dos países, principalmente para aqueles que ainda estão em desenvolvimento. Os benefícios podem atrair investimentos, gerar empregos, reduzir a fuga de cérebros e fomentar inovação e modernização produtiva.
Impactos para o desenvolvimento regional
Resultados do Estudo Econômico da América Latina e do Caribe de 2024 indicam um baixo nível de desenvolvimento econômico e incerteza no âmbito das políticas fiscais e monetárias na região. Nesse sentido, para que haja uma estabilização do cenário, é necessária a articulação de políticas públicas e incentivos privados que estimulem o desenvolvimento produtivo das economias emergentes.
Investimentos consistentes em PD&I, como apontam dados do IGI, demonstraram aumento da produtividade de trabalho, expectativa de vida e redução da pobreza. Ainda que os números não sejam tão expressivos, o relatório aponta que aportes sustentados, maior adoção de tecnologias disruptivas e estratégias abrangentes para aproveitar a inovação desencadeiam benefícios socioeconômicos e ambientais, principalmente a longo prazo.
Nesse sentido, o desenvolvimento de políticas fiscais para investimentos em PD&I pode auxiliar na reversão do quadro econômico da América Latina. Além de benefícios estruturais, incentivos fiscais para inovação também apontaram uma atração de capital e uma maior integração em cadeias globais. Desta forma, a disponibilização de orçamento público para o mercado aumenta a competitividade dos países e facilita o posicionamento frente a grandes potências.
Incentivos fiscais na América Latina
Na América Latina, países como Brasil, Chile, Colômbia, Peru, México, El Salvador e Argentina possuem políticas tributárias diversas, cada uma com percentuais específicos de concessão de crédito fiscal, mas, em todos os casos, o uso desse benefício é restrito ao território do próprio país.
Atualmente, o Chile lidera os países latino-americanos como o mais maduro em relação a políticas fiscais em P&D. O país possui uma legislação, Lei de P&D (nº 20.241), desde 2008, que inicialmente era aplicada exclusivamente para centros de pesquisa. A partir de 2012, entretanto, foi permitida a extensão do benefício às empresas privadas. No país, os incentivos não possuem limite de tempo para sua utilização e já são aderidos por boa parte das companhias elegíveis. Apesar do percentual de concessão ser relativamente alto (35% de crédito fiscal), o Chile possui uma limitação para investimentos exclusivos em P&D, sem contemplar inovação.
A Lei de Promoção da Ciência, Tecnologia e Inovação Tecnológica (n.º 30309) no Peru, por uma obrigação do próprio país, é atualizada a cada três anos, desde sua criação em 2014. Em vista da falta de conhecimento e busca por parte das empresas, a nação apresenta uma baixa maturidade no aproveitamento. No entanto, o incentivo contempla, além das atividades de pesquisa e desenvolvimento, iniciativas associadas com inovação e consiste em uma redução de imposto a pagar de até 27%, sobre as despesas realizadas em investimento de PD&I.
Na Colômbia, em contrapartida, o incentivo atual, que começou em 2016, possui a melhor porcentagem de retorno da América Latina, com concessão de créditos de até 50% do investimento realizado em PD&I. Contudo, em 2024 este país não teve liberação de verbas por parte do governo para novos projetos postulados. Espera-se que em 2025 mude este cenário e que seja liberado orçamento que fomente pesquisa e inovação nesta nação.
Ainda que não seja amplamente conhecido, o Incentivo Fiscal para Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico (EFIDT) no México concede créditos fiscais para projetos que promovam avanços tecnológicos e científicos. No entanto, é importante ressaltar que esse incentivo se aplica a despesas incrementais, ou seja, apenas àquelas que excedam a média de investimentos realizada pela empresa em anos anteriores.
Argentina e El Salvador, apresentam incentivos recentes e com baixo reconhecimento, com grande potencial de serem utilizados. Na Argentina, por exemplo, o Regime de Promoção da Economia do Conhecimento é pouco utilizado pois o incentivo existente anteriormente era voltado, principalmente, a empresas de software. Contudo, a partir de 2020, o país começou a promover atividades de outros setores, ampliando, assim, o número de companhias com potencial de ser fomentadas.
Em El Salvador, por outro lado, o benefício entrou em vigor apenas em 2023. Porém, estimula as atividades de PD&I por meio da isenção de pagamento de imposto associado à renda destas atividades, além de outros benefícios complementares que fazem deste incentivo mais chamativo para as organizações privadas locais.
Cenário Brasileiro
Todos os países citados, com exceção do Brasil, precisam passar por um processo de pré-aprovação para conseguirem usufruir dos incentivos e ainda contam com a possibilidade de postularem projetos plurianuais. No Brasil, o cenário é diferente. A concessão de créditos pela Lei do Bem, principal mecanismo de estímulo à inovação no país, só ocorre mediante o resultado daquele ano específico, resultando em um menor controle sobre o planejamento a longo prazo.
Criada em 2005, a Lei do Bem (Lei 11.196/05) disponibiliza a partir de 20,4% do valor investido em inovação como redução tributária de IRPJ e de CSLL. Contudo, em cenários perfeitos, com pesquisadores exclusivos e patentes/cultivares concedidos, o incentivo pode chegar a até 34% (45% para empresas do setor bancário). O benefício, voltado para companhias tributadas pelo regime de Lucro Real, viabilizou R$ 41,93 bilhões em investimentos em projetos de PD&I em 2023, de acordo com a pesquisa PINTEC semestral de 2023.
Segundo os dados mais recentes do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a Lei do Bem ainda é subutilizada, apesar de ter sido constatado crescimento de 15,9% no número de empresas beneficiadas quando comparado com o ano anterior. Nesse cenário, existem consultorias especializadas que atendem as legislações brasileiras e de outros países da América Latina, prestando suporte para empresas estruturarem os incentivos e estimularem o desenvolvimento socioeconômico de seus países.
Os incentivos na América Latina ainda estão em desenvolvimento, mesmo apresentando bons resultados. Quando comparadas a países desenvolvidos, as políticas fiscais precisam ser melhor estruturadas, divulgadas e estáveis. Cada país se destaca em diferentes aspectos, e, por possuírem conjunturas similares, podem se espelhar em características como a maturidade chilena em P&D, a creditação de 50% da Colômbia e a eficácia da Lei do Bem no Brasil, para que os incentivos ficais se tornem uma ferramenta integrante e protagonista do desenvolvimento socioeconômico da região.
Por Andressa Melo e Katherine Manrique